Germaine Dulac: muito além da vanguarda (2ª parte)

De 28 de novembro a 3 de novembro de 2023 o Centro Cultural São Paulo e a Vai e Vem Produções promovem a segunda parte da mostra Germaine Dulac: muito além da vanguarda, com exibição de filmes e cine-concerto.

Pioneira do cinema de vanguarda e do cinema feminista, Germaine Dulac é figura incontornável da cultura cinematográfica internacional. Desde o fim dos anos 1910, quando realizou seus primeiros filmes e começou a escrever influentes ensaios sobre a estética do cinema, ajudou a legitimar o cinema como uma arte autônoma, ao mesmo nível das demais, assim como abriu caminhos para experimentação ao largo das práticas cinematográficas dominantes. Junto a cineastas como Louis Delluc, Jean Epstein, Abel Gance e Marcel L’Herbier, que também defendiam um cinema autoral, formou no início dos anos 1920 o primeiro movimento de vanguarda no cinema francês, conhecido posteriormente como Cinema Impressionista. Em longas-metragens narrativos, esses realizadores fizeram amplo uso de recursos propriamente cinematográficos como fusões, desacelerações, distorções de lente, mudanças de foco, extremos close-ups, movimentos de câmera e diversas técnicas de montagem no sentido de expressar ou representar experiências subjetivas. Desse modo, Dulac realizaria ousadas produções em termos formais que exploravam e transmitiam a subjetividade feminina – os sonhos, fantasias e desejos de suas personagens – sob um ponto de vista pioneiramente feminista, como em A Sorridente Madame Beudet (1923), Alma de Artista (1924) e Antoinette Sabrier (1927) e algo queer, como em Um Convite à Viagem (1927), realizado com a assistência de sua então companheira, Marie-Anne Colson-Mallevile.

Em 1927 realizaria a sua obra mais conhecida, A Concha e o Clérigo, com roteiro do dramaturgo e poeta Antonin Artaud. Considerado o primeiro filme surrealista, A Concha e o Clérigo dava forma concreta aos processos de pensamento inconscientes por meio de uma sucessão implacável e imprevisível de imagens, aparentada à mecânica dos sonhos. Não estava assim limitado pelas convenções de coerência narrativa, continuidade espaço-temporal e caracterização de personagens ainda presentes nos filmes anteriores de Dulac.

Essa recusa das convenções do cinema narrativo seria radicalizada ao fim da década de 1920 após longo período de reflexão sobre as técnicas do cinema (inspiradas em tendências modernas da dança, música e poesia) para moldar os feixes de luz, construir ritmos visuais, transmitir sensações e deleitar os sentidos, o que culminaria na realização de três filmes “puros” ou “ensaios cinegráficos”. Disco 957, Temas e Variações e Estudo cinegráfico sobre um Arabesco (1929) são pequenas sinfonias visuais ordenadas ritmicamente pela montagem, compostas por imagens que se equilibram entre a figuração e a abstração.

Na mostra Germaine Dulac: muito além da vanguarda serão exibidos a totalidade dos filmes vanguardistas da realizadora, recentemente restaurados. Do restante da extensa produção de Dulac serão exibidos também O Cigarro (1919), filme chave do que seria considerado como o Cinema Impressionista e mais antigo filme da realizadora ainda preservado, assim como outras produções de sucesso que conjugavam modos narrativos mais tradicionais com inovadoras técnicas cinematográficas como Alma de Artista (1924),  Antoinette Sabrier (1927) e Um Convite à Viagem (1927). Todas essas produções serão exibidas em cópias restauradas, incluindo-se também o icônico filme A Sorridente Madame Beudet, que completa neste mês de novembro 100 anos de sua primeira exibição pública.

As sessões serão acompanhadas por produções que antecipam algumas das preocupações de Dulac e alguns filmes que estabelecem diálogo direto com aqueles da cineasta. Além disso, serão exibidos um grande conjunto de curtas-metragens de realizadoras que, desde os anos 1930 até a atualidade, seguiram distintos caminhos de experimentação no cinema abertos por Dulac. Cada filme da cineasta será assim exibido junto a produções que possuem propostas conceituais e temáticas afins ou desenvolvem pesquisas formais anteriormente esboçadas por Dulac. Pretende-se assim associar e desdobrar cada produção da cineasta francesa a um conjunto de filmes de realizadoras tão diversas como  Maya Deren, Rose Lowder, Chick Strand, Raymonde Carasco, Ana Vaz, Julie Dash, Marie Menken, Nazli Dinçel, Joyce Wieland, Sandra Lahire, entre outras. Em sintonia com esse esforço também será exibido o recente Vai e Vem (2022), de Fernanda Pessoa e Chica Barbosa, no qual essas realizadoras trocam cartas audiovisuais inspiradas formal e temáticamente no trabalho de diversas cineastas, incluindo algumas das acima citadas.

Programação

29/11, quarta-feira, 19h – Programa 1 (50 minutos)

Dança Excêntrica por Lina Esbrard (Danse Excentrique per Lina Esbrard). Direção: Alice Guy-Blaché. 1902, 1 min. P&B.

Lina Esbrard emula a dança serpentina de Loie Fuller com um vestido estampado com motivos de cobra.

Disco 957 (Disque 957). Direção: Germaine Dulac. 1929. 6 min. P&B.

Por meio do princípio da sinestesia, na qual um tipo de estímulo evoca a sensação de outro, Dulac buscou nesse curto filme “puro” encontrar um equivalente visual dos Prelúdios nº 5 e nº 6 de Fréderic Chopin. O título e a sequência inicial em torno do jogo de luzes sobre um disco anunciam o motivo cíclico dominante do filme assim como remete, segundo a realizadora, à dança serpentina de Loïe Fuller.

Parábola (Parabola). Direção: Mary Ellen Bute & Ted Nemeth. 1938, 9 min. P&B.

Produzido em parceria com o escultor Rutheford Boyd, Parábola celebra a potencialidade do cinema em mostrar de novas maneiras as formas que nos rodeiam. A partir de justaposições entre luz e sombra, imobilidade e movimento, o filme nos convida a ver a curva parabólica como uma sedutora “poesia da natureza”.

Tempo (Zeit). Direção: Milena Gierke. 1991. 9min. Cor.

“Uma semana capturada em time-lapse. Aproximadamente a cada 8 segundos, eu filmo um quadro. Vê-se uma mesa com um vaso cheio de gladíolos. As flores murcham lentamente. Três peixinhos dourados são observados em seu aquário. Uma vela é substituída à medida que queima, e a velocidade diferente com que cada vela queima torna-se visível. Uma pequena televisão funciona sem parar, no Canal 1 alemão. Há uma cadeira à esquerda onde às vezes me sento para comer ou ler. Um relógio está pendurado na parede, assim como um calendário. […] A realidade é capturada duas vezes em ‘tempo real’: quando um peixe está gravemente doente e uma vez para capturar todo o cenário.”

Atos Solitários #4 (Solitary Acts #4). Direção: Nazli Dinçel. 2015. 8 min. Cor.

A cineasta se filma masturbando o objeto do debate. Ela ouve outras pessoas reivindicarem seu corpo, seus hábitos: aqueles no ambiente conservador de sua infância. O espectador também a reivindica, observando-a nesse ato privado. Ela tem 9 anos, depois 12. Ela observa ícones populares, descartando a agência de seu corpo. Depois rejeita o outro, os objetos externos ao seu corpo: com alguma angústia adolescente, nega o clímax a todos, exceto a si mesma.

Mansfield K. Direção: Martine Rousset. 1988. 17 min. Cor.

“Leituras. Um texto de Katherine Mansfield. Um lugar. Pureza das linhas. Fineza dos ângulos. Domínio de brancos e azuis. Fragilidade dos vidros cônicos. Forte contraste de luzes. Sonhar com esses espaços, páginas escritas. Texto proposto: a câmera poderia ler a inscrição exata. Imagens abstratas. Trabalho único de luzes, linhas e ritmos. Um olhar que se lê à luz das vozes. A transfusão luminosa de um estilo. Uma possível e justa metáfora?” Martine Rousset

29/11, quarta-feira, 20h30 – Programa 2 (66 minutos)

Antoinette Sabrier. Direção: Germaine Dulac. 1927. 66 min. P&B. Com: Eve Francis, Gabriel Gabrio e Paul Guide.

Controverso na época de seu lançamento, Antoinette Sabrier narra a história de uma mulher independente e sexualmente liberada que está dividida entre o marido e seu amante. Dulac se utiliza de seu ousado senso de ritmo visual e de inovadoras técnicas cinematográficas de então (como câmera lenta e montagem associativa) para realizar uma investigação sutil da intimidade de uma mulher.

30/11, quinta-feira, 19h – Programa 3 (49 minutos)

Luta de Boxe (Combat de boxe). Direção: Charles Dekeukeleire. 1927. 6 min. P&B.

Um poema cinematográfico composto pela alternância de planos positivos e negativos cujo pretexto são os esforços incansáveis de dois boxeadores.

Estudo cinegráfico sobre um arabesco (Étude cinégraphique sur une arabesque). Direção: Germaine Dulac. 1929. 7 min, P&B. Com: Marie-Anne Colson-Mallevile.

O arabesco, nos usos na dança, na decoração e na música, constitui-se pela ligação e entrelaçamento de linhas (melódicas) e formas (geométricas) nos limites entre figuração e abstração. No filme “balé cinegráfico” de Dulac, o arabesco refere-se tanto ao meticuloso modo de encadeamento rítmico entre planos rápidos e lentos, inspirado nos dois arabescos de Claude Debussy, quanto às formas e linhas presentes nos distintos planos encadeados (de arcos de luz, bicas d’água, teias de aranha, plantas que brotam, flores e folhagens, sorrisos, braços que se alongam, etc.).

Answer Print. Direção: Mónica Savirón. 2016. 5 min, Cor.

Answer Print é uma colagem de filmes em 16mm com cores desbotadas por ação da “síndrome de vinagre”, reação química da degradação que ocorre na película de acetato de celuloide e que tanto a torna vermelha-púrpura quanto provoca um forte cheiro de vinagre. A trilha sonora é constituída pelo áudio gerado pela dupla perfuração do celulóide, pela trilha óptica dos filmes sonoros e pela tonalidade produzida por cada um dos cortes da montagem quando lidos pelo projetor. Na reprodução do mecanismo sonoro da projeção do celulóide Savirón evidencia a fragilidade e inevitável degradação das imagens no tempo assim como do mundo que as produziu e que elas reproduzem.

Atomic Garden. Direção: Ana Vaz. 2018. 8 min. Cor.

Campos de flores recém-nascidas, pequenos agrupamentos de abelhas sobreviventes, espécies de plantas resistentes e novos tipos de ovos depositam-se na nossa costa, obrigando-nos a escavar e a procurar o significado de uma vida tão inesperada…

Merapi. Direção: Malena Szlam. 2021. 8 min. Cor

Um estudo circunlocutório do Monte Merapi, na Indonésia. Movendo-se para frente e para trás ao redor do vulcão, o filme é marcado pela presença silenciosa de seu estrondo e lava. Quase sempre no centro, o vulcão muitas vezes desaparece atrás das nuvens, como um fantasma. A obra é silenciosamente estruturada em torno da impressão ondulante do vulcão ao seu redor: a fumaça através das árvores, a chuva caindo nas suas encostas e a rica fertilidade de seus solos. Uma obra sensível à mudança da luz através de redemoinhos de grãos de 16 mm e da atmosfera assim como à vida em seu horizonte, perto da densamente povoada Jacarta.

Bouquets 1-10. Direção: Rose Lowder. 1994-1995. 10 min. Cor.

Primeira coleção de filmes de um minuto de duração da realizadora. “Estruturada na câmera durante a ‘filmagem’, segundo métodos gradualmente desenvolvidos em meus filmes anteriores, esta pesquisa se desenvolve para compor um buquê fílmico de imagens colhidas a cada vez no mesmo local, em momentos diferentes. Esses buquês de imagens selecionadas e tecidas em ordem alternada também incluem alguns fotogramas indesejados que, como ‘ervas daninhas’, podem ser prejudiciais ou úteis, dependendo das circunstâncias.” Rose Lowder

Arabesco para Kenneth Anger (Arabesque for Kenneth Anger). Direção: Marie Menken. 1961. 5 min, Cor.

Nesse breve filme, realizado em apenas um dia, Menken concentra-se nas fontes, estátuas, entradas de luz natural, mosaicos, azulejos e demais ornamentos do palácio de Alhambra, marco da arquitetura árabe na Espanha. Com a câmera na mão, em movimentos livres, oscilantes e rítmicos, assemelhados à dança flamenca e intensificados pela montagem, Menken interpreta cinematograficamente a riqueza plástica dos arabescos geométricos e florais.

30/11, quinta-feira, 20h30 – Programa 4 (85 minutos)

Alma de Artista (Âme d’artiste) Direção: Germaine Dulac. 1924. 85 min. P&B. Com: Iván Petrovich, Nicolas Koline, Mabel Poulton, Yvette Andréyor.

Esta comédia de bastidores, baseada numa peça do do poeta dinamarquês Christian Molbech, destaca a especificidade do meio cinematográfico em relação ao teatro através do uso inovador de cinejornais, efeitos técnicos e mise-en-abîme. A surpreendente abertura do filme e o drama que se segue entre um frágil poeta e uma atriz independente afirmam a especificidade cinematográfica e a inversão dos convencionais papéis de gênero.

01/12,  sexta-feira, 15h45 – Programa 5 (50 minutos)

O Cigarro (La Cigarette). Direção: Germaine Dulac 1919. 50 min, P&B. Com: Andrée Brabant, Gabriel Signoret, Jules Raucourt e Genevieve Williams.

Neste filme, assim como em A Sorridente Madame Beudet, realizado alguns anos depois, Dulac aborda a vida doméstica de uma mulher infeliz e atormentada por questionamentos a respeito de seu casamento. Sua veia crítica àquele que é então tido como papel da mulher na sociedade, fruto de uma militância feminista bastante consolidada, aqui encontra uma narrativa bem acabada, porém ainda distante da estética vanguardista. Este é considerado o mais antigo filme de Dulac ainda preservado.

01/12,  sexta-feira, 19h – Programa 6 (64 minutos)

Jogos de reflexo e velocidade (Jeux des reflets et de la vitesse). Direção: Henri Chomette. 1925. 8 min. P&B.

Velocidades, formas, superfícies; um filme em que a ação não reside na representação, mas em si mesmo. Chomette o descreve como cinema puro ou intrínseco. Não imagens pelas imagens, mas uma exposição-justaposição de objetos e paisagens ativadas por operações cinematográficas (aceleração, dupla exposição, impressão em negativo): “Uma série de visões incongruentes – inconcebíveis fora do casamento entre a lente da câmera e o filme móvel – cujo efeito é negar-nos o sentido, a representação, o cinema intelectual da reflexão. Um cinema de sensação física e visual, precisamente aquela emoção visual de que fala Germaine Dulac. O cinema como transporte. Um cinema dos olhos e do coração, uma cinemação”. Prosper Hillairet

Temas e Variações (Thèmes et variations). Direção: Germaine Dulac. 1929. 9 min, P&B. Com: Lilian Constantini.

Planos de uma bailarina que dança se alternam com o movimento de máquinas e elementos da natureza. Comparações, aproximações, contrastes e variações são organizados segundo a estrutura musical de temas e variações. “Eu evoco uma dançarina. Uma mulher? Não. Uma linha saltitante de ritmo harmonioso. Eu evoco uma projeção luminosa em véus! Precisamente! Não. Ritmos fluidos. Por que desprezar na tela o prazer que o movimento nos traz no teatro? Harmonia das linhas. Harmonia da luz. Linhas, superfícies, volumes evoluindo diretamente, sem o artifício da evocação, na lógica de suas formas, despossuídos de qualquer sentido excessivamente humano, para melhor ascender à abstração e dar maior espaço às sensações e aos sonhos: o cinema integral.” Germaine Dulac

Copacabana Beach. Direção: Vivian Ostrovsky. 1983. 10 min. Cor.

Um vislumbre bem-humorado do que acontece todas as manhãs nas calçadas onduladas da praia de Copacabana. Preparação física ao estilo brasileiro, com pitadas de futebol e alusões à Carmen Miranda.

Gradiva: Esboço I (Gradiva: Esquisse I). Direção: Raymonde Carasco. 27 min, Cor.

A cineasta retira o aspecto mínimo essencial do romance de Wilhelm Jensen, Gradiva (tema de célebre estudo de Freud), que relata a história de um arqueólogo fascinado pela figura de um antigo baixo-relevo que retrata a caminhada de uma jovem de Pompéia. De modo demorado, monumental, solene, como um ritual, vemos sucessivos passos de mulheres sobre antigas pedras. Um balé abstrato sobre a fetichização do desejo.

Bouquets 11-20. Direção: Rose Lowder. 2005-2009. 10 min. Cor.

Segunda coleção de filmes de um minuto de duração da realizadora. Esse buquê fílmico foi colhido na Itália, Suíça e França, e alternadamente entrelaçado quadro a quadro, produzindo explosões de cores e vibrações.

01/12,  sexta-feira, 20h30 – Programa 7 (62 minutos)

A Sorridente Madame Beudet (La Souriante Madame Beudet). Direção: Germaine Dulac. 1923. 38 min, P&B. Com: Germaine Dermoz, Madeleine Guitty e Jean d’Yd.

Baseado numa peça de vanguarda homônima, o filme busca traduzir visualmente a vida interior – os pensamentos, memórias, sonhos, fantasias e desejos – de uma mulher insatisfeita, presa em um casamento opressivo. O imaginário feminino da protagonista, uma moderna mulher cultivada, é articulado sob seu ponto de vista e amplificado por uma gama de técnicas cinematográficas inovadoras e por alusões à pintura, à música e à poesia simbolista. Lançado em Paris em novembro de 1923, A Sorridente Madame Beudet é considerado o primeiro filme feminista.

Lady Lazarus. Direção: Sandra Lahire. 1991. 24 min. Cor.

Uma resposta cinematográfica à poesia de Sylvia Plath, declamada pela própria escritora. Um carrossel de imagens de suas obsessões (tábuas ouija, cavalos, automutilação) em uma atmosfera de constante metamorfose; a poesia como cinema. Com humor macabro investiga-se uma existência que a própria Plath denominou, em entrevista concedida pouco antes de sua morte, como “viver no ar”.

02/12, sábado, 15h – Programa 8 (54 minutos)

Um Convite à Viagem (L’invitation au Voyage). Direção: Germaine Dulac. 1927. 39 min, P&B. Com: Emma Gynt, Raymond Dubreuil e Robert Mirfeuil.

Cansada de ser ignorada pelo marido, uma jovem dona de casa se dirige a um cabaré frequentado por marinheiros desordeiros. Ela chama a atenção de um belo marinheiro andrógino, que a faz imaginar distintos progressos para o romance. Como nos demais filmes impressionistas da cineasta, a atenção se volta principalmente ao mundo interior dos personagens, sugerida por associações de imagens e motivos visuais recorrentes. Baseado no poema homônimo de Charles Baudelaire.

Water Sark. Direção: Joyce Wieland. 1965. 13 min. Cor

“Resolvi fazer um filme na mesa da minha cozinha; não há nada como conhecer minha mesa. A elevada arte da dona de casa. São necessários prismas, vidros, luzes e eu mesmo para isso. ‘A dona de casa está chapada’. Trata-se de um filme-escultura construído enquanto você espera.” Joyce Wieland.

Mulher de Mil Fogos (Mujer de Milfuegos). Direção: Chick Strand.
1976. 15 min. Cor

Uma espécie de filme de fantasia herética. Um retrato expressionista e surrealista de uma mulher latino-americana assim como uma evocação da consciência das mulheres em certos territórios de Espanha, Grécia e México; mulheres que se vestem de preto a partir dos 15 anos e que passam toda a vida parindo, cozinhando e realizando tarefas domésticas ou agrícolas. Mulher de Mil Fogos descreve de forma poética, quase abstrata, as repetitivas tarefas diárias dessas mulheres na forma de um ritual obsessivo.

02/12, sábado, 20h – Programa 9 (54 minutos)

Trilha sonora ao vivo executada por OLIB Ensemble.

A Concha e o Clérigo (La coquille et le clergyman). Direção: Germaine Dulac. Roteiro: Antonin Artaud. 1928. 40 min, P&B. Com: Alex Allin, Genica Athanasiou e Lucien Bataille.

Obcecado pela mulher de um general, um clérigo percorre um mundo fantasmático de alucinações, metamorfoses e desejos que se encadeiam ritmicamente. “Não devemos buscar uma lógica ou uma sequência que não existem nas coisas, mas, ao contrário, interpretar as imagens que se desenvolvem na direção de sua significação essencial, íntima, uma significação interior, e que vai de fora para dentro. A Concha e o Clérigo não conta uma história, mas desenvolve uma série de estados mentais que derivam uns dos outros como o pensamento deriva do pensamento, sem que esse pensamento reproduza a ordem racional dos fatos. Do choque dos objetos e dos gestos derivam verdadeiras situações psíquicas, em meio às quais o pensamento aprisionado procura uma saída sutil. Nada existe aí a não ser em função das formas, dos volumes, da luz, do ar – mas sobretudo em função do sentido de um sentimento liberado e nu, que escorrega por entre os caminhos pavimentados de imagens e atinge uma espécie de céu onde desabrocha inteiramente.” Antonin Artaud

Na Terra. (At Land). Maya Deren, 1944, 14 min. Cor

Em uma narrativa onírica, uma mulher (Maya Deren) é levada pela praia e parte em uma estranha jornada encontrando outras pessoas e outras versões de si mesma. Trata-se, segundo a realizadora, de um filme sobre a luta para manter a identidade pessoal.

O OLIB Ensemble é um grupo especializado na criação e performance ao vivo de trilhas musicais de cinema. O grupo surgiu para criar trilhas ao vivo para as produções do coletivo Atos da Mooca (constituído basicamente por professores universitários que se dedicam à investigação e produção de produtos audiovisuais com foco no cinema Super 8). Com o tempo, o OLI Ensemble ampliou sua atuação e já participou do IV Festival Internacional do Cinema Super 8, da Feira de Cinema – Sesc Vila Mariana, do Cinelimite na Cinemateca Brasileira, dentre outros festivais dedicados ao tema. É formado, atualmente, pelos músicos e artistas sonoros Alexandre Marino, DeCo N. e Vitor Kisil.

03/12, domingo, 16h – Programa 10 (82 minutos)

Vai e Vem. Direção: Fernanda Pessoa e Chica Barbosa. 2022. 82 min. Cor.

Como contraponto ao mundo virtual e (des)conectado, duas amigas criam uma provocação fílmica seguindo suas normas. Um vai e vem que em tempos turbulentos se torna uma dança de resistência.